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Resenha | A VEGETARIANA, de Han Kang (Editora Todavia)

Vencedora do Prêmio Nobel de Literatura do ano passado, a sul-coreana Han Kang narra a vida de uma mulher que decide não comer mais carne e a vida de alguns membros de sua família acabam se transformando devido essa decisão.



As obras de Han Kang já haviam ganhado o Brasil antes de 10 de outubro do ano passado, data em que a Academia Sueca anunciou que a autora foi a vencedora do Prêmio Nobel de Literatura de 2024. A sul-coreana recebeu o prêmio de 11 milhões de coroas suecas em cerimônia realizada no dia 10 de dezembro do mesmo ano.


Em nossas terras, três das obras da sul-coreana foram publicadas pela editora Todavia. Confesso que não conhecia a sua obra antes de sua vitória, mas logo após o anúncio, li as sinopses e algumas críticas dos livros publicados em português e optei pôr A Vegetaria para conhecer o trabalho da autora. E confesso, me ferrei, pois terei que comprar os demais livros da autora, pois a narrativa me prendeu de uma forma única.

 


A tal vegetariana é Yonghye, esposa de um executivo, que decide abdicar de carne após um sonho muito estranho, para não dizer perturbador, e segundo ela, muito real. E não é só isso, ela não quer mais cozinhar nenhum animal, tão pouco que seu marido coma carne dentro de casa, ou em sua frente, e menos ainda que leve algum alimento do tipo para casa.


Fora que, assim que Jeong descobre a decisão da esposa, se depara com uma limpa feita pela casa, onde tudo o que estava na geladeira do casal foi para o lixo. Ou seja, era tolerância zero para carne a partir de então e causa diversos reboliços ao casal, para a família e à mulher, aparentemente tímida, é irredutível quanto a sua decisão.


Com o tempo, a rotina de Yonghye foi sendo totalmente transformada, onde se recusa a ter relações com o marido, além de outras restrições que passou a realizar depois da decisão de não comer mais proteínas animais. Fora outros pesadelos, daqueles que acordamos totalmente arrepiados, alucinam a sul-coreana, e são sempre regados a sangue e morte.


“Eu já tinha ouvido falar que estava na moda ser vegetariano. Com o objetivo de ter uma vida mais longa, de mudar o metabolismo e se livrar das alergias. [...] Mas de onde vinha aquela postura extravagante da minha mulher? Ela não era mais adolescente, não precisava perder peso nem tinha que se curar de alguma doença, e mesmo assim tinha resolvido mudar de hábitos alimentares depois de um pesadelo.”

p. 18 e 19


Dividido em apenas três capítulos, sendo eles bem extensos e cada um é quase que único ao ter sempre ao centro a vegetariana e um de seus parentes. No primeiro, A Vegetariana, acompanhamos de perto a vida de Yonghye com seu esposo Jeong; na sequência, A mancha mongólica, seu cunhado é quem está em foco; e por fim, Árvores em chamas, é a sua irmã quem acompanha a jornada da protagonista.


Enquanto no primeiro capítulo a autora fisga o leitor logo nas primeiras linhas, quando descreve Yonghye através dos olhos do esposo, o segundo capítulo é muito mais descritivo, bem à la Eça de Queirós, pois são três páginas só para descrever o estúdio artístico do cunhado. E no último capítulo, ele é muito mais narrativo e é possível começar a juntar as pistas dadas pela autora no decorrer do livro através de um olhar médico e científico.


Mesmo com três pontos de vista totalmente diferentes e uma história que segue uma linha do tempo a cada página, vemos um marido meio bunda-mole, que por vezes poderia defender a esposa ou se impor mais com decisões colocadas a ele, um cunhado estranho e uma irmã que ama verdadeiramente aquela que carrega o seu sangue.


“Yeinghye ficara estranha havia três anos, quando de uma hora para a outra, se tornou vegetariana. [...] Ela perdeu peso dramaticamente, quase não dormia, e se já era do tipo que falava pouco, tornou-se incomunicável.”

p. 129

 

O impacto da escrita de Han Kang e a visibilidade da cultura sul-coreana

Han Kang ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em uma época em que a cultura sul-coreana, aparentemente esquecida até então, ganha a cena mundial. O sucesso dos doramas, das séries Round 6 e The 8 Show, fora a banda BTS, que abriu caminho para o gênero musical K-Pop, que virou uma mania mundial com foco nos mais jovens.


E agora, para a literatura, temos as ficções que unem cotidiano, história e cultura do país, e especialmente em A vegetariana, onde cada personagem traz uma mente e psique única de cada um devem ser levados em conta para compreender melhor a narrativa, além de um alerta para cada leitor que tem sido cada vez mais comum, o da saúde mental. Logo, junto com a autora Hwang Bo-Reum e com as séries e filmes, como 12.12: O Dia, que estreia em breve no Brasil, conhecemos a história e cultura do país dividido entre sul e norte, de democracia frágil.

 

A importância do cuidado editorial da obra

A edição da obra, tem um ótimo cuidado, típico das obras da Todavia, e, fora a escrita que fisga o leitor com reviravoltas bem construídas, podemos destacar a excelente tradução feita por Jae Hyung Woo, que usa termos bem brasileiros como “boa de garfo” e “mana”, em trechos onde provavelmente se encontravam gírias orientais. Além de boas notas de rodapé que auxiliam entendermos termos da cultura sul-coreana, como para comidas, festas e costumes. Algo bem difícil de acontecer em romances traduzidos aqui no Brasil.



A Todavia anunciou para maio o lançamento de Sem despedidas, já em pré-venda, romance de Han Kang que mescla a história de seu país e a vida cotidiana, e tem como centro uma escritora que se muda de Seul para a ilha Jeju para ajudar uma amiga hospitalizada. A trama fala de trauma e resiliência.


Com isso, eu estou ferrado pois quero ler mais um livro da autora antes do lançamento de Sem despedidas. A dúvida que fica é qual será o próximo livro que irei ler da autora. Será que leio O livro branco, ou opto por Atos humanos?


E você, enquanto isso, leia A vegetariana, e como eu, se encante pela escrita de Han Kang, autora sul-coreana que tem ganhado o mundo, além do Prêmio Nobel de Literatura.


Abraços Literários,


1 Comment


mmarion
Apr 01

Parabéns pela bela resenha!

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